Texto: Gabriella Gomes (agabriellagomes@hotmail.com)
Ilustração: Gabriel Brito
Compreender a liberdade de expressão no meio virtual é tão importante quanto entender as origens que ela tem e como esse direito – ou sua negação –interfere em nossa convivência digital hoje.

Com o acesso à tecnologia e às redes sociais, muitas pessoas puderam se expressar de diversas maneiras. De acordo com pesquisa realizada em junho de 2020 pela Nielsen Brasil com 1260 pessoas das classes A, B e C, 97,56% dos entrevistados disseram acessar a internet todos os dias, e entre eles 77,24% afirmaram interagir nas redes sociais.
Mas afinal o que é a liberdade de expressão? Ela é um direito constituído por lei que busca garantir a todos os indivíduos a liberdade de expressar sua opinião. Poder apresentar nossas ideias e concepções sem barreiras e por quaisquer meios é importante porque elas carregam nosso julgamento pessoal sobre as coisas, nosso modo particular de ver e pensar.
Alguns pontos merecem ser destacados para que se compreenda a importância desse direito. Um deles é o fato de que o Brasil foi se constituindo, ao longo dos séculos, em cima de uma série de autoritarismos, o que levou os brasileiros a se acostumarem a ser censurados desde a sua colonização. E isso se reflete de uma maneira tão profunda na vida das pessoas que acaba passando de forma despercebida.
O Relatório Global de Expressão 2019/2020 feito pela organização Artigo 19 – ONG inglesa que atua no Brasil desde 2007 promovendo e defendendo o direito à liberdade de expressão e o acesso universal à informação – mostra que entre 2009 e 2019 o Brasil foi o país que teve a maior queda no indicador de liberdade de expressão – 18 pontos entre 2018 e 2019 – entre 161 países, passando a ocupar a 94ª posição.
Isso interfere diretamente na forma como nos expressamos e até mesmo nos posicionamos, fazendo com que não nos sintamos à vontade para nos expressar e nos manifestar. O que ainda pode ser piorado com a existência de mecanismos de censura.
Hoje percebemos um clima de ódio e polarização se espalhando nas redes sociais e frequentemente nos deparamos com atitudes de ‘cancelamento’ como aconteceu com diversos artistas que ‘pisaram na bola’, caso da ex-participante do BBB Karol Conká que foi alvo de críticas por conta de seus comentários no programa. Casos como esse levam muitas pessoas a alimentarem o medo de serem ‘canceladas’.
Segundo o site Segs, que comentou pesquisa realizada pela rede social Yubo, 51% dos jovens entre 10 e 25 anos entrevistados têm medo de serem cancelados, enquanto 25% afirmam já terem deixado de publicar algo por conta do risco de que isso ocorra. E é por meio desse efeito inibidor, de não serem aceitos por estarem fazendo ‘algo errado’, bem como pelo medo de que exposições inadequadas possam direcioná-las a um possível cancelamento, que algumas pessoas passam a praticar autocensura.
O Brasil teve sua base de construção social no patrimonialismo (ausência de distinção entre o público e o privado), e no patriarquismo (sistema sociopolítico que coloca os homens em situação de poder), e ambos se refletem em nossa atualidade quando poucos mandam e muitos obedecem, e quando o que importa não são os direitos, mas os valores que são defendidos.
Não podemos afirmar que no Brasil exista uma liberdade de expressão efetiva, e nem que os brasileiros se considerem plenamente livres para se expressarem no meio virtual ou social. Mas mesmo em meio a uma sociedade que influencia e dita padrões, as redes sociais podem vir a nos dar a possibilidades de driblar a censura e preservar a liberdade de expressão.
Portanto é necessária uma implantação efetiva da democracia nas redes sociais, que possibilite ouvir, ser ouvido e ter credibilidade. Mas para isso é necessário que exista a cultura de apreço pelo outro. A liberdade de expressão não é um direito só de quem pensa como a gente. Ela significa pluralismo, divergência, diálogo. Afinal a única forma de resolver um conflito ou um impasse sempre será o diálogo, e é a partir disso que poderemos defender a liberdade de expressão, sem que as pessoas se sintam ameaçadas por quem pensa diferente.