Texto: Bianca Coelho
Eu nunca quis a amizade dela. Sempre que a via de longe, conversando com alguns conhecidos, sentia a necessidade de manter distância. Meus amigos já haviam me avisado que sua companhia me traria problemas difíceis de enfrentar. Além disso, nada naquela figura me agradava: o jeito como falava, como muitas vezes induzia a atitude dos outros e principalmente sua agressividade ao ser contrariada. Ainda não entendo como aquelas pessoas conseguiam andar com ela. Será que não enxergavam aquela relação tóxica?
Com o tempo parei de apenas confabular e comecei a agir. Precisava afastá-la caso tentasse se aproximar de mim ou meus amigos. Na faculdade éramos um grupo unido, sempre se ajudando nos trabalhos e rindo das simplicidades do dia a dia. Juntos, conseguíamos administrar com leveza as questões acadêmicas e ainda desenvolver uma vida social saudável. Não havia motivo para me preocupar com a entrada dela em nossa panelinha, pois não existia espaço para uma aproximação com nenhum de nós. Era o que eu acreditava no início. Infelizmente estava errada.
Para minha surpresa, ela começou a conversar com o amigo que mais a repudiava e que me alertara dos problemas que ela já causara na faculdade e fora dela. Mas lá estava ele, lentamente imergindo naquele furacão. O resto do grupo tentou por vezes convencê-lo a dar um fim àquela aproximação, sem sucesso. A cada dia os laços ficavam mais profundos e os nós mais difíceis de serem desatados. As consequências logo vieram. Os momentos de felicidade ao lado dele tornaram-se raros. Nosso amigo se afastou de todas as esferas de sua vida. Da faculdade ao namoro, da família ao círculo social. Seus olhos estavam voltados somente para ela e suas influências.
As coisas ficaram mais sérias quando aquela amiga indesejável começou a pedir para que ele fizesse coisas por ela. Primeiro era matar aulas para ficarem juntos, exigindo total atenção. Depois o persuadiu para que se afastasse de nós e que não andasse com ninguém além dela. Contudo, sua pior exigência foi que ele desistisse de tudo, o que a essa altura não era algo tão difícil de conseguir, visto que ele já estava muito fraco para reagir. O amigo tão querido, que outrora enchia de felicidade os corredores da faculdade tornara-se uma casca vazia. Ninguém mais o via.
Esse episódio fragilizou não só ele, mas todo o nosso o grupo, que lentamente se desmantelava. Ela, por outro lado, aproveitando-se desse estado coletivo de pesar, voltou para a faculdade, visivelmente sem nenhum peso na consciência. Ainda com um certo acanhamento, veio falar comigo sobre o que havia acontecido e eu só pude dizer o quanto estava arrasada com tudo o que estava acontecendo. Nessa pequena brecha deixada por mim, ela conseguiu se aproximar. Eu não percebi naquele momento, mas eu seria sua nova vítima.
A nossa amizade se fortaleceu muito mais rápido do que eu imaginava. Em poucos meses éramos inseparáveis, assim como ela com ocorreu com ele. Eu me apoiei naquela nova amiga para tentar superar toda a dor que sentia pelo que aconteceu, mas esqueci que quem deixou meu amigo naquele estado foi ela. Um grande erro. Com o tempo também senti as influências dela, cada vez mais fortes, conforme ia me entregando àquela relação. Parei de comer, não dormia direito e comecei a faltar as aulas. Em todos esses momentos ela me fazia companhia, mas de forma alguma me trazia conforto. Dela eu só recebia julgamentos, dizendo que eu era insuficiente, que ninguém sentiria falta de mim e que eu era fraca demais para fazer alguma diferença. Eu acreditei.
Quanto mais me aproximava dela mais me afastava de mim. Fui a única a não perceber esse desrespeito. Como não conseguia enxergar, foi pelos olhos de quem de fato se importava comigo que eu finalmente vi a verdade: eu estava com depressão. Muito ao contrário do que ela me dizia, eu tinha, sim, quem prezava pelo meu bem e foram essas pessoas que me incentivaram a buscar um fim para aquela relação tóxica. O tratamento psicológico e psiquiátrico tornou mais fácil o que para mim era impossível.
Ao levantar da cama pela primeira vez, tive forças para ajudar outras pessoas a levantarem também. A primeira delas foi meu amigo.