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Opinião 103

“Faz o L”


Ao longo do primeiro semestre de 2024, a greve dos técnicos e docentes dos institutos e universidades federais ganhou força. Ao todo, até meados do mês de junho, 62 instituições de ensino superior aderiram à paralisação, segundo o balanço feito pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN). Os grevistas reivindicam uma recomposição do orçamento das universidades, melhorias nas condições de trabalho, além de reajuste salarial.

Segundo uma pesquisa de opinião feita pelo Instituto Quaest, 78% da população entende como justa a greve dos docentes, enquanto apenas 19% entende como injusta e, cerca de 3% não tem uma opinião formada sobre o tema. Apesar dos dados demonstrarem que a maior parte da população seja favorável à greve, no cenário das redes sociais esse apoio não se confirma.

Desde que foi anunciada, a greve tem gerado muita polêmica nos diversos meios de comunicação e divide opiniões entre a população, polarizadas entre quem é contra ou a favor. Inclusive, algo a destacar é que ao abrir os comentários em notícias de jornais em redes sociais, ironias e deboches a respeito da situação são frequentes.

Dentre as manchetes que anunciaram a greve, o perfil da Jovem Pan News, em 24 de maio, anunciou o seguinte: “Universidades Federais rejeitam acordo proposto pelo governo e decidem manter greve”. Ao abrir a aba de comentários, não demora muito para esbarrar com comentários inflamados. “Professores de esquerda tem mais é que passar por isso”; “militantes dentro de sala de aula. Agora engole o choro e continua trabalhando” e claro, o mais típico e frequente de todos, “Faz o L”.

Não que seja uma surpresa, um jornal, já conhecido por estar alinhado ao discurso conservador, ter um público com opiniões tão tendenciosas quanto as dele. Porém, será que a preocupação dessas pessoas é de fato com a educação? O que esses comentários revelam é, na verdade, um desdém pela pauta e um ataque a professoras e professores com posições políticas progressistas. Como se fosse um crime questionar o sucateamento histórico da educação neste país.

Esses ataques não se restringem a perfis conservadores. Seja qual for o jornal, esquerda ou direita, de renome estadual ou até nacional, é praticamente impossível fugir dessa epidemia de comentários desinformativos, que revelam a incapacidade, de parte da população, em argumentar sobre temas tão importantes para o país. “Socialista, comunista e esquerdista” são palavras utilizadas como sinônimos da universidade pública. “… Façam o L agora!!!! A greve acabou por quê? Conseguiram o quê, caros doutrinadores e disseminadores das ideologias socialista, comunista, esquerdista, e ista!”, este é um dos comentários retirado da manchete “Greve de professores da UFMG termina após 51 dias” publicado em 5 de junho pelo jornal mineiro, O Tempo.

Quando se trata do cenário local, nos dois ciberjornais mais acessados da capital, como o Campo Grande News e o Midiamax, a situação não melhora muito. Esses jornais acabam se tornando palco para deboches feitos por quem desvaloriza intencionalmente o trabalho feito dentro das universidades públicas. Nas matérias: “Professores da UFMS entrarão em greve a partir de 1 de maio”, publicado em 23 de abril pelo Campo Grande News, ou no Midiamax, “Greve na UFMS: 50% dos professores aderem a paralisação por novo acordo salarial”, publicado em 26 de abril, chovem desinformação. Os leitores/as culpabilizam apenas o governo atual pelo desmonte da educação, sem levar em conta que esse sucateamento vem ocorrendo há muito tempo, por meio de cortes de verbas na educação e o prejuízo a servidores, estudantes e à população como um todo.

Além disso, grande parte desses discursos também afirmam que quem votou no PT deve “engolir o choro”, ou seja, não pode reclamar. O que, mais uma vez, é contraditório, visto que cobrar o governo não é apenas um direito, mas um dever de todos, em especial dos eleitores, faz parte de uma sociedade democrática. Mas o que vemos não são argumentos lógicos, mas um ciclo de desinformação que se mantém, de comentário em comentário.