Texto e Ilustração: Gyovana Marinho
Em 20 de Setembro de 2024 foi lançado “A Substância,” um filme do gênero terror corporal, escrito e dirigido pela francesa Coralie Fargeat. Na trama, a protagonista Elizabeth Sparkle, aterrorizada pelo seu envelhecimento e as perdas que sofre por não ser considerada atraente, toma A Substância. A droga misteriosa e exclusiva, promove a separação celular que cria Sue, uma outra versão de Elizabeth. Sue é linda, jovem e tem o corpo perfeito. Usando da sua imagem ideal, Sue consegue se tornar o novo rosto da emissora que Elizabeth havia sido aposentada.
Mas há um problema: é preciso manter o equilíbrio, pois elas alternam a consciência a cada sete dias de vida. Sue sente que somente sua vida importa e toma o controle além do tempo permitido, consequentemente, Elizabeth começa a definhar de forma rápida. Na sua essência, o filme questiona como mulheres têm seu valor julgado de acordo com sua aparência e o quão longe iríamos para alcançar a tão sonhada perfeição. Uma frase do filme viralizou: “ já sonhou com uma versão melhor de si mesmo?”

“Nada é tão gostoso quanto se sentir magra.” Na vida real, a frase da modelo Kate Moss em entrevista para a revista Women’s Wear Daily era o mantra para as meninas que sonhavam com o corpo perfeito no final dos anos 90 e início dos anos 2.000. A época é marcada por dietas malucas e modelos com corpos tão magros que roupas da sessão infantil ficavam folgadas.
Em 2005, pesquisadores da Universidade Santa Catarina analisaram 1.148 adolescentes, de 10 a 19 anos, em Florianópolis e concluíram: 15,6% apresentavam sintomas de anorexia nervosa e 18,8% tinham problemas de imagem corporal. As meninas de 10 a 13 anos apresentavam prevalência de sintomas de anorexia nervosa e 90% dos casos de transtornos alimentares eram do público feminino.
Nos anos 2010, com a viralização das Kardashians, um novo tipo de corpo vira tendência: as curvas, antes tão temidas, se tornam o novo ideal. O procedimento BBL(Brazilian Butt Lift) vira o novo sonho de consumo. Cintura fina, glúteos e quadris avantajados e barriga lisa compõem o corpo perfeito estampado no instagram. O melhor de tudo: basta pagar um cirurgião para conseguir o seu.
As que não podiam pagar, poderiam utilizar os filtros e aplicativos de edição para projetar sua versão ideal.
Algumas, mais desesperadas pelo corpo perfeito, arriscavam a vida em clínicas clandestinas, como ocorreu com Maria José Medrado de Souza Brandão morta durante a aplicação de hidrogel nas nádegas em 2014, ou Louanna Adrielle Castro Silva, miss Jatai Turismo, que morreu durante o implante de silicone em 2012.
Desde a pandemia, a hashtag Y2K já acumula mais de 18 bilhões de visualizações no TikTok. A hashtag objetiva glamourizar e reinventar a era dos anos 2000. Voltada principalmente à moda da época, milhões de usuários são bombardeados com tendências e fotos de ícones fashion da época, sendo a maioria modelos e atrizes com uma coisa em comum: a magreza. Assim, o mercado passa por um rebranding e volta a vender o corpo magro, chás para emagrecimento e termos como orgânico, clean e saudável. Com os avanços da medicina, o Ozempic é criado e de repente toda felicidade e satisfação que você precisa, estão na pontinha da agulha.
Em menos de 25 anos, o padrão de beleza para o corpo feminino sofreu diversas alterações, diferente dos homens que quase não recebem críticas sobre suas aparências. A figura da mulher, dentro de uma sociedade capitalista e patriarcal, se torna um objeto a ser observado, moldado e aperfeiçoado, como um projeto feito em laboratório. Assim como em “A substância,” mulheres buscam soluções milagrosas para alcançar a perfeição e serem como Sue. Meninas e mulheres de diversas idades adoecem, se ferem e passam a vida sonhando com um corpo que não é delas e nunca poderá ser, pois a perfeição é tirana, detalhista e principalmente exclusiva.