Texto: Breno Kaoru
Ilustração: Eliel Dias
No mítico estádio de Wembley, em Londres, torcedores celebravam a vitória da seleção italiana na Eurocopa de 2020 – que por conta da Pandemia de Covid-19 só foi realizada em 2021. Enquanto o troféu era levantado, gritos de “Itália!, Itália!” eram ouvidos em uníssono. Em meio a esse nacionalismo, porém, o capitão Jorginho que levantava a taça e corria com ela em mãos não era um italiano, era um brasileiro. Em 2024, no confronto entre Jordânia e Catar na grande final da Copa da Ásia em Lusail, ao final do jogo no mesmo gramado que presenciou a vitória catari, três jogadores naturalizados também comemoravam a vitória. Dois deles nascidos no Brasil e outro no Sudão correram a volta olímpica como parte da seleção campeã. Todos esses casos envolvem um tema comum no futebol, a naturalização de jogadores. Quando um jogador opta por representar uma seleção distinta de seu país de nascença.
Vistas como símbolo nacional, as seleções carregam muito mais do que apenas uma camisa ou uma instituição, elas carregam a cultura do país e representam um povo, um grupo que compartilha uma identidade cultural e histórica, criando um senso de pertencimento e de destino coletivo, uma nação. Em países divididos por alguma questão complexa, política, por exemplo, a seleção nacional une as pessoas para torcer pela nação. Uma simples vitória numa partida de Copa do Mundo, então, pode ser motivo de festa para pessoas com ideias ou percepções diferentes. Porém, quando aquele que veste a camisa vem de outro país, surge uma pergunta: afinal, o que define a “cidadania” de um jogador? O passaporte? O sangue? A cultura?
A cultura pode ser um fator determinante, mas nem sempre o único fator. Matheus Nunes, por exemplo, é um caso de identificação cultural. O jogador do Manchester City, nasceu no Rio de Janeiro, mas cresceu em Lisboa. Ao se destacar pelo Sporting, teve que enfrentar um dilema, defender sua terra mãe ou defender a terra que o acolheu. No final, optou por defender os europeus, motivado pela identificação com o país lusitano.
Já Denis Cheryshev, nascido na União Soviética, mas criado na Espanha, nunca escondeu a preferência por seu país de criação. “Sou mais espanhol que russo”, declarou em entrevistas. Por isso, aguardou um convite espanhol que nunca veio. Restou-lhe jogar pela Rússia. Sem espaço no país com o qual se identificava, optou pela oportunidade no país natal.

Filhos de imigrantes se destacam e viram heróis nas seleções europeias, um exemplo é Mbappé, ícone do futebol francês com origem camaronesa. No entanto, essa exaltação na vitória vira segregação na derrota. Özil sabia: cada gol seu vestia a Alemanha de festa. Mas quando o gol era contra, o mesmo país lhe devolvia um sobrenome turco como recado. Hoje esses jogadores vivem em uma linha tênue entre o pertencimento e o peso da exclusão, os mesmos países que celebram suas vitórias são os que os negam na derrota e, ainda, recusam passaportes para milhares de imigrantes.
Os chamados filhos da diáspora, indo na contramão da história e do fluxo migratório, são atletas europeus filhos de imigrantes, buscando oportunidade nas seleções do país de origem de seus pais. Seleções como Argélia e Marrocos recrutam jogadores europeus com descendência africana em países como a Espanha. Brahim Diaz e Gouiri, são exemplos, o primeiro nascido em Málaga na Espanha defende Marrocos e o segundo, francês de nascença, joga pela Argélia.
No final, a busca por melhores oportunidades sempre foi o grande objetivo de todos que migram de uma terra para outra, e no futebol não é diferente. Assim como um imigrante que sai de seu país visando melhores condições, os jogadores vestem outra camisa também com essa intenção, a busca por holofotes e maiores chances, uma oportunidade de se destacar e mudar suas carreiras.
Seja por identificação, seja por condições de vida, de qualquer forma, a naturalização não é uma escolha simples, é uma tentativa e é, muitas vezes, um redirecionamento. Jorginho correndo pela Itália, Cheryshev cantando o hino russo com sotaque espanhol, Matheus Nunes carregando Portugal nos braços, eles sabem que a camisa que vestem é uma rota recalculada, não jogam por bandeiras e hinos. Afinal a bola não tem pátria.