Texto: Carla Andréa (c_andrea@ufms.br) | Carolina Rampi Gimenes (c.rampi@ufms.br)
Ilustração: Bianca Esquivel
Não é de hoje que os biomas brasileiros estão diminuindo por conta de incêndios. Os focos de calor na Amazônia, de janeiro a setembro deste ano, são os maiores desde 2010, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que usa um satélite para perceber onde há temperaturas elevadas e fazer esse mapeamento. Em 2020 é a vez do Pantanal também sofrer com o fogo, que já destruiu 4,2 milhões de hectares de janeiro a outubro, de acordo com o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (LASA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dados do INPE mostram que só no mês de setembro foram registrados no bioma Pantanal 8.106 focos de calor, o maior número contabilizado desde o inicio do monitoramento em 1998. Em função disso, diversas espécies da fauna nativa estão sendo atingidas pelo fogo e calor, e várias enfrentam sério risco de extinção por causa desses incêndios.

Muitos animais não conseguem escapar do fogo. Mas mesmo os que não morrem acabam feridos – o que pode ser causado tanto pelas chamas quanto pela fumaça – e enfrentam a falta de alimento, que também foi queimado. Algumas espécies se ferem ao pisar no solo, que ainda arde por debaixo das cinzas. Aves se intoxicam ao inalar fumaça. As imagens e relatos de tanta mortandade escancaram o sofrimento animal, como o de um jabuti que provavelmente ficou cercado pelo fogo e, sem ter como fugir, acabou morrendo dentro do próprio casco.
Retratando a natureza há mais de 50 anos, o fotógrafo Araquém Alcântara conta, em entrevista para o Globo News, como foi ficar duas semanas documentando os desastres do Pantanal: “Eu vi a face do horror. E é triste, mas essa mortandade de animais, essa fuligem no ar, essa terra arrasada escancaram mesmo é a nossa ignorância”. As fotos que fez nesse período mostram animais no meio de cinzas, lagos secos e árvores mortas.
Pesquisa realizada este ano pelo Instituto Homem Pantaneiro (IHP) analisa que haverá alterações nos alimentos, padrões de comportamento e migrações de animais em função dos incêndios que estão ocorrendo. E espécies que já estavam ameaçadas de extinção tiveram seu risco ampliado pelo fogo. Isso está ocorrendo, por exemplo, com as onças pintadas, uma das espécies símbolo do país. Muitas não sobreviveram ao fogo e as que conseguiram encontrar abrigo foram localizadas desidratadas, desnutridas e/ou com queimaduras nas patas. O Parque Estadual Encontro das Águas, em Paconé – MT, conhecido por ser um dos maiores abrigos de onças pintadas do mundo, já teve 85% do seu território destruído pelo fogo. As Araras Azuis são outra espécie vulnerável, uma vez que seus ninhos estão sendo consumidos pelo fogo.
O repórter Vinícius Valfré e o fotografo Dida Sampaio, em cobertura especial para o jornal O Estado de S. Paulo – Estadão –, contam como foi presenciar essas cenas. “A quantidade de bichos mortos que você vê é de cortar o coração”, relata Dida. Mas isso não parece estar incomodando as autoridades. Vinícius explica que o trabalho de proteção e resgate de animais não está sendo feito pelos governos estaduais nem pelo federal. São voluntários e ONGs que percorrem a região para prestar os primeiros socorros e levá-los a centros de reabilitação.
Muitas dessas organizações não governamentais vêm tentando alimentar a fauna sobrevivente, deixando frutas e legumes cortados em áreas que o fogo não atingiu. A ONG SOS Animais do Pantanal conseguiu arrecadar, nas primeiras semanas de outubro, seis toneladas de alimentos para ser distribuídas tanto para os animais quanto para os brigadistas e bombeiros. Além disso, o Conselho Regional de Medicina Veterinária de Mato Grosso do Sul (CRMV-MS) tem feito campanha para doação de produtos médico-veterinários e de primeiros socorros como gazes, ataduras e anestésicos.
Mas toda essa situação não é causada por algo natural. Pois embora a região centro-oeste tenha uma “estação seca” bem definida, que inicia em torno de março e se estende geralmente até outubro, em 2020 esse período começou mais cedo por conta de diversos fatores. É a ação do homem – desmatando e provocando queimadas, entre outras questões – que tem potencializado a queima da vegetação e transforma pequenos focos em incêndios descontrolados de grandes proporções.
Ou seja, a fauna pantaneira está sofrendo pela falta de responsabilidade do homem. Não só dos culpados, mas também das autoridades, que assistem a situação de longe e não tomam uma atitude. A Polícia Federal está investigando as causas e causadores dos incêndios, mas nada comprovado ainda. As ONGS estão tentando amenizar a situação, mas ainda é pouco para os milhões de animais que vivem na região. Com isso, resta apenas a tentativa de conter o fogo e manter vivo o bioma Pantanal e as espécies que ali vivem.