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Reportagem 99

E se eu governasse?

Em ano de eleição, seis entrevistados jovens compartilham suas histórias, crenças e convicções sobre política. Eles são os candidatos dessa narrativa

Texto: Felipe Arguelho | Isadora Prado | Kawhã Rodrigues | Luiza Vonghon


Governar é dar direção, ter propósito, é representar. Entre nossas opções de voto, candidatam-se seis jovens de até 21 anos, emergentes na política a partir dos 16. Com classes sociais, culturas e fenótipos diferentes, propõem suas soluções para as demandas do nosso Brasil.

O Candidato 1, é o Pedro Thiago. Com 18 anos, uma pele parda e cabelos castanhos, foi criado por uma mãe formada pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos) e que posteriormente ingressou e se formou em Direito. Aos 16 anos, Pedro escolheu cursar uma universidade privada, avançando para a graduação antes mesmo de finalizar seu ensino médio.

Agatha Echeverria, de 16 anos, é nossa Candidata 2, uma mulher transexual – não binária. Ainda estudante, ela se vê, futuramente, como uma possível jornalista ou psicóloga. Vestindo geração Z da cabeça aos pés, com um delineado preto e um casaco fora da sua medida, ela fala de sonhos e objetivos para o coletivo.

A Candidata 3, Jéssica Alves, 21, é aluna de Direito na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e professora de redação há dois anos. Guarda seus domingos para aproveitar a família. Se apresentou de cabelos compridos e unhas vermelhas que seguiam a mesma tonalidade do seu batom. Ela é filha de policial militar e é bailarina por hobby.

Silas Simões, 19 anos, é trabalhador, se mantém com dois empregos como autônomo: um restaurante e uma pizzaria, e cuida da sua loja online de roupas. Simões iniciou, em Brasília, a graduação em administração, que ainda não terminou. Silas é, então, nosso Candidato 4.

Ana Carolina, é mais uma concorrente, é estudante de medicina, recém ingressada. Com mechas claras e cabelos ondulados, se encaixa no padrão de beleza do meio em que se insere. Com 20 anos, Ana é a Candidata 5.

Amanda Karoline fecha nosso quadro eleitoral, sendo a Candidata 6. Graduanda em Arquitetura e Urbanismo, divide seu tempo cuidando de uma ONG que distribui alimentos em seu bairro e indo à igreja. A candidata tem 20 anos. 

O voto é o que escolhe os representantes das diferentes instâncias governamentais. É a mudança do agora, a compreensão do passado e a justificativa do futuro. Estudar um candidato é garantir uma cobrança justa, é saber quem te representa, cuida e direciona para o melhor caminho. Dedique-se à dinâmica do texto, partiremos para os debates e propostas.

Pela democracia plena, jovens nas urnas já!

A juventude participar facultativamente das eleições foi um marco para a democracia. Desde 1988, no governo de José Sarney, a opinião eleitoral conta com jovens de 16 a 18 anos para decidir o futuro da sociedade, o destino dos estados e culturas. Depois de 25 anos de ditadura militar, em 1985, a democracia renasceu. Em 1990, em eleições democráticas, Fernando Collor foi eleito com forte apoio dos jovens, mas dois anos depois, por seus escândalos de corrupção, lidou com a ferocidade da mesma juventude.

Em 2022, a nova geração mostra força mais uma vez. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou em seu portal os números de inscrição e retirada do título de eleitor. Os dados eram desanimadores, apenas 2% dos jovens aptos a votar, entre 16 e 18 anos, tinham o título.

Infografia: Marcus Gonçalves | Fonte: TSE

Frente a esse cenário, o TSE organizou em seu perfil um “tuitaço” com a hashtag “#Roledaseleições”, que buscava incentivar os jovens de 15, 16 e 17 anos a participar ativamente na democracia do país, elegendo seus representantes municipais, estaduais e federativos. Voluntariamente, artistas como Anitta, Juliette, Bruna Marquezine entre outros, participaram da campanha “#Tire o Título” junto com o “#Rolê Das Eleições”. “Vocês ficam falando [Anitta, faz alguma coisa], mas não dá pra salvar o país sozinha não… Faz esse título de eleitor aí logo”, comentou Anitta, na sua rede social, em março de 2022.

O ano de 2022 fechou, então, o primeiro semestre com um aumento de 47,2% de jovens aptos a votar, em comparação ao mesmo período em 2018, segundo dados fornecidos pelo TSE, alcançando  2.042.817 eleitores com 16, 17 e 18 anos. Para o professor da UFMS e cientista político, Daniel Miranda, 37, a soma da participação dessa juventude no voto, pelas urnas eletrônicas, é decisiva em eleições mais fechadas como as presidenciais. “1000 votos a mais ou a menos podem fazer diferença nos resultados”, declara o especialista.

A influência de seu pai, teólogo e bispo de uma igreja regional, impulsionou Silas a estar ativo como cidadão e já, aos 16 anos, votar com discernimento.

“Para mim, exercer esse poder democrático, é definir o futuro, pois quando não voto, não posso cobrar do meu Brasil estar da forma que não me agrada”, comenta.

Mas o interesse não é o mesmo para todos. A decepção e o ceticismo afetam os jovens eleitores, como é o caso de Amanda, nossa Candidata 5. Acreditando que eleger uma pessoa é também se responsabilizar pelos fracassos do político, Amanda se desaponta. “Só vejo bandidagem,  acabo não querendo me envolver. Tampouco para votar, por que eu iria eleger mais um desonesto?”.

Aos 16 anos, Ana Carolina não entendia muito bem suas escolhas, e votou com base nas crenças de sua mãe. Sem engajamento ou opinião pré-estabelecida em eleições passadas, foi às urnas sem base. O curso de medicina proporcionou conhecimento, por exemplo, sobre o SUS (Sistema Único de Saúde). “Os governos não me afetam, meu cotidiano, social e outros ciclos não mudam. Mas estudando, atendendo cidadãos, a minha visão sobre o governo mudou”, destaca a Candidata 4.

Pela educação e economia, vote em nossos candidatos!

De acordo com Daniel Miranda, a política é um conjunto de atividades começadas em pequenas ações até legislações mais elaboradas. Ele explica que a partir do momento em que os jovens assumem responsabilidades e tem entendimento sobre o que está a sua volta, conseguem compreender melhor a política como um todo.

“Não consigo desassociar a política da minha vida, minha existência é política”

Para Agatha, nossa Candidata 2, ocupar movimentos políticos é representar outras pessoas como ela, que  nunca foram ouvidas. Contemplada por bolsa, ela estuda em uma escola particular e faz parte do ‘Repórter Júnior’, projeto de extensão do curso de Jornalismo da UFMS. “O tempo me ajudou a perceber o que é política, e a repressão que sentia me obrigava a ser política. Não consigo desassociar a política da minha vida, minha existência é política”, responde com empolgação.

Nas eleições gerais de 2022, cerca de 28 mil candidatos e candidatas se registaram em variados cargos, mas apenas 58 pessoas se identificaram como transsexuais, segundo pesquisa realizada pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Para Agatha, ver pessoas como ela no plenário seria de suma importância, além da representatividade, que mostra ser possível para transsexuais estarem em lugares de poder e promovendo mudança social.

Jessica, Candidata 3, pensa em reger o estado baseada em dois pilares, sendo eles, educação e economia. Política é uma forma de decidir em conjunto. “Sou mulher, dou aulas de redação e curso direito. A educação conversa muito com a economia, o futuro do país  são pessoas que se formam pela base comum curricular. Inserir política nesse currículo é a chave para o sucesso”,  explica.

Em 2021, os investimentos na educação foram os mais baixos desde 2012, de acordo com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). As verbas autorizadas para 2022 são R$6,2 bilhões menores que as verbas de 2021. Para a terceira Candidata, ver esses números é de grande abalo. Se eleita, ela acabaria por se deparar com um cenário desanimador nessa área. A educação ajuda jovens carentes a terem uma condição de vida digna, sendo a principal porta para melhoria de vida.

“A política está envolvida em tudo que a gente faz. É o poder de decisão das coisas, em tudo hoje em dia ela está embutida. Por exemplo: o fato de eu precisar ir ao mercado fazer uma compra, a política reflete nisso, nosso governo reflete nisso. Ela está em todos os lugares, espelha-se na nossa sociedade por completo, todo dia sofrendo pela nossa escolha”,  afirmou Silas. O Candidato 4, vê que as escolhas políticas são retratadas no dia a dia da população, no valor dos produtos, e não somente nas urnas,  no processo de eleição.

Os valores dos alimentos e bebidas aumentaram 9,83% no primeiro semestre de 2022, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dessa forma, a fome no país atinge, atualmente, cerca de 33 milhões de brasileiros, 14 milhões a mais do que em 2020. Seis a cada 10 brasileiros não têm o que comer, indicam os dados retirados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) e executados pelo Instituto Vox Populi. Para um governo com maior enfoque em controlar a fome, fatores como a inflação seriam um obstáculo na gestão. “Todo dia sofremos pelas nossas escolhas”, reforça o candidato.

É possível analisar que cada candidato tem vivências diferentes, o que interfere na forma de cada um pensar a política. A percepção individual interfere diretamente no coletivo e, o coletivo é um órgão político dirigido por um representante federal que acompanha as necessidades do corpo que lidera. Nenhuma mudança, para obter níveis razoáveis de qualidade de vida e lazer, pode ser realizada da noite para o dia. A mudança política exige tempo, disposição, reflexão e envolvimento da juventude.

“Mas e se eu governasse?”

O ato de governar é de suma responsabilidade. Para ocupar o cargo máximo do país os jovens têm ideias distintas, mas que se conectam pela pretensão de melhorar o Brasil. Na visão de Silas, o apoio de outros políticos é fundamental para que haja um governo bem sucedido para toda a população. Já para Ana Carolina, há limitações no cargo de presidente, ela preferiria ser senadora com o intuito de ser mais ativa nas criações de leis.

A proposta de Pedro e Agatha são semelhantes, ambos, se governassem, pretendem focar em justiça social, ajudar pessoas pretas e minorias a estarem em lugares importantes. Investir em bolsas de estudos, nas artes, área acadêmica e na ciência.

“A periferia tem talento, conhecimento e cultura. A hegemonia branca é mais inclusa em todas as pautas, e a gente não é inserida por ter outras preocupações, preocupações que desanimam”

Há ainda quem acredita que a educação é a chave para o progresso, por isso a base do governo de Jessica seriam os estudos. Ela afirma que um país bem estruturado e com investimentos nas escolas têm os melhores resultados no desenvolvimento social. Amanda, desistiu de sua candidatura por não acreditar na melhoria de um futuro por meio da política, mesmo assim, focaria, principalmente, nas pessoas em situação de extrema pobreza, e como já participa de uma ONG, tentaria ajudar mais as organizações.

Desde o grito da independência, nas margens do rio Ipiranga, brasileiros e brasileiras  ansiavam por esperança. Após a ditadura militar, continuaram na busca por liberdade e cuidado com o povo. No Brasil, de um sonho intenso, um raio vívido, os jovens à terra descem. No formoso céu, risonho e límpido, a imagem da juventude resplandece.