Texto: Maria Eduarda Fernandes
Ilustração: João Antônio
Na tela do celular encontro a fuga do meu medo, mergulhando em um oceano de conexões superficiais. É como se cada clique, cada curtida, fosse uma âncora temporária para afastar a solidão que insiste em me cercar. No fundo, uma ilusão de proximidade que não passa disso: uma doce e amarga ilusão.
Navego pelas redes sociais para preencher o vazio aqui dentro, com uma miragem de interações virtuais. Em meio a fotos cuidadosamente planejadas e realidades distorcidas, tento encontrar um senso de pertencimento e de validação. Porém, por mais que me esforce, algo falta.
Na busca pelo corpo ideal e a rotina equilibrada, eu me vejo fora desse padrão. É um sentimento semelhante ao de um intruso. Não me encaixo nas expectativas pré-fabricadas, nas poses ensaiadas e nos filtros que escondem a verdade por trás da tela. Esses modelos me sufocam, me engolem, torturam e devoram lentamente. Dia após dia.
Pinto minha palidez com as cores da dor, seguindo o rastro do vazio deixado pelos que vieram antes de mim. Moldo meu comportamento conforme os padrões ditados por aqueles que são considerados referências. Me esforço para me encaixar em um mundo onde a aceitação é medida em likes e compartilhamentos. Na faculdade, naquele grupinho popular. No trabalho, com os funcionários que puxam o saco do chefe. Em casa, tentando superar aquele primo que faz medicina. É um ciclo sem fim. E não importa quantas vezes eu tente, ou o que eu faça, parece que eu nunca vou ser boa o suficiente para ninguém. Talvez, nem mesmo para mim.
Há tempos tento lutar contra esse sentimento de inferioridade, mas apesar de todos os esforços, a solidão persiste pesada e palpável. A cada amanhecer retorno à tela do celular, desesperada em busca de um alívio momentâneo para o vazio que me habita. É como se eu precisasse ver a “pseudo-blogueira” acordada desde às 5h da manhã fazendo um “check” na lista de tarefas do dia dela, para então começar a sabotar o meu. Eu sei que é uma busca em vão e que a verdadeira conexão não pode ser encontrada em pixels e algoritmos. Mas, quando vejo, já estou presa nesse mundo de aparências.
No palco da vida, tento desempenhar meu papel. Parece que falta um elo. Talvez se eu fosse magra, talvez se eu fosse meiga, mas sinto-me assim: inadequada e incompleta. Busco ser boa, só que a sensação de que nunca alcanço esse padrão persiste. Procuro ser amada e aceita como sou, mas sinto que o amor está sempre além do meu alcance, me rodeia, mas não me basta. Por mais que eu tente e me doe, a impressão de não ser suficiente é como uma sombra, que me acompanha onde vou.
Quando a noite chega, e eu finalmente posso me desfazer das personas que criei para cada momento daquele dia, me vejo mais uma vez diante da tela, inquieta para me afogar novamente num mar de ruína digital. Não faz nenhum sentido. No fundo, só busco uma maneira de escapar da minha própria solidão sem aceitar que ela sempre esteve e sempre estará aqui ao meu lado.

A cada dia que passa, sinto-me mais distante e desconectada da minha essência. É como se eu estivesse perdendo lentamente minha identidade, diluindo-me nas miragens digitais que me cercam. E enquanto busco incansalvelmente por uma fuga desse labirinto de ilusões, percebo que a verdadeira liberdade só pode ser encontrada dentro de mim. É uma jornada solitária, dolorosa e vazia.
Nas profundezas mais obscuras desse abismo digital vislumbro um raio de esperança. Uma realidade além das telas brilhantes do meu dispositivo, onde a liberdade é mais do que uma palavra vazia. A liberdade é uma experiência visceral de autenticidade e conexão. E nesse vislumbre encontro forças para continuar a jornada, mesmo que pareça uma batalha perdida desde o início.
Talvez eu nunca seja boa o suficiente para os outros, quem sabe um dia busque ser boa o suficiente para mim mesma. É o que deveria me importar. Escolho me desfazer dessas amarras, aceitar a minha imperfeição e me tratar com mais carinho. Desligo a tela do celular, coloco as vozes da minha cabeça no mudo e finalmente abraço a minha própria condição. Não deve ser tão difícil assim ser real. Vou tentar mais uma vez.