Texto: Maria Eduarda Fernandes
Ilustração: João Antônio
Quando me matriculei no curso de Jornalismo, há quatro anos, o entusiasmo e o idealismo pulsavam em minhas veias. Sonhava em desvendar os mistérios do mundo, em ampliar as vozes dos que não tinham e, principalmente, em desafiar as injustiças por meio da escrita. À medida que os anos foram passando e fui ingressando no mercado de trabalho, mesmo como estagiária, me dei conta que a prática da profissão tem pouco dessa fantasia que eu idealizava.
Certo dia, cheguei no estágio e me pediram para fazer algo que colocava em xeque o que havia aprendido na faculdade. Como uma boa estudante de jornalismo, questionei a
solicitação e ouvi: “Esqueça tudo que você aprendeu na faculdade, aqui a realidade é outra!”. E por um momento, eu esqueci.
Nesse dia, me dei conta que, no cenário acelerado e competitivo do jornalismo, essa expressão, muitas vezes proferida com um tom de condescendência, sugere que a teoria acadêmica não se traduz na realidade do mercado de trabalho jornalístico. Porém, ao invés de aceitar isso como uma verdade inquestionável, é crucial avaliar porque essa disparidade existe e como ela impacta a qualidade, a integridade e, principalmente, a liberdade do jornalismo contemporâneo.
Por mais nobre que seja a missão, o jornalista muitas vezes é relegado à margem da sociedade. Desvalorizado, subestimado e até mesmo atacado, enfrentando uma batalha
constante pela própria sobrevivência. Um grande exemplo disso foi a pandemia da Covid-19, em que o último governo intensificou as ondas de ataques e a propagação de fake news. Desde então, a sociedade passou a questionar a veracidade e, mais, a “utilidade” do profissional.
Na verdade, essa pauta é antiga. Desde 2009, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu mais uma vez que, qualquer pessoa independentemente de formação, poderia assumir as funções de jornalista, essa “utilidade” é questionada. Atualmente, é comum ver influencer, atriz ou qualquer pessoa aleatória assumindo essa posição e, mais que isso, ganhando visibilidade em programas de TV com um salário muito melhor. Como diferenciar quem é apenas um simpatizante da internet, textos e televisão, de alguém que passou anos para conseguir chegar ali. Como distinguir as notícias veiculadas por quem tem formação e estudos, de quem fundamenta textos por achismos?

Ao adentrar nas redações, percebi que a realidade da profissão muitas vezes se distancia da visão romântica que via nos filmes e projetava como fundamental, ou até mesmo da que os professores compartilhavam em sala. E isso é, no mínimo, desanimador. A atuação profissional, que tinha tudo para ser um espaço de criatividade e expressão, se torna, muitas vezes, um campo de batalha, onde a pressão por resultados imediatos sufoca qualquer tentativa de liberdade editorial. A busca incessante por hard news e a demanda por conteúdo sensacionalista transformam a escrita jornalística em um exercício de conformidade.
É penoso perceber que, apesar do meu empenho e estudo, sou limitada pelo jornalismo atual, onde a pressão do mercado é uma constante ameaça, afinal, se eu não fizer “a porta da rua é a serventia da casa”. Então, qual é a razão de tanta persistência? A resposta é simples, o jornalismo ainda é capaz de provocar mudanças e estimular o debate público. Cada matéria que escrevo é como um ato de liberdade, mesmo que dentro das restrições, ela tem o poder de impactar pessoas e contribuir para a busca da verdade.
Enquanto me aproximo do fim da minha jornada acadêmica, questiono se as vozes autênticas são ouvidas acima do ruído. Ainda assim, é nos cantos mais éticos e íntegros da profissão que encontramos vestígios do verdadeiro Jornalismo. Talvez, contudo, seja justamente nesses cantos esquecidos, onde o compromisso com a integridade persiste apesar das adversidades. Contrária ao ‘exercício da conformidade’ é que continuo a escrever textos como esse e nunca, jamais, esquecerei o que me foi ensinado na faculdade.