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Opinião 97

O esquecimento dos atletas olímpicos

João Pedro dos Santos


Nas Olimpíadas de Tóquio, a emoção tomou conta dos atletas e dos torcedores brasileiros em várias ocasiões, pois em meio ao caos da pandemia, um pouco de alegria e esperança foi reapresentada às pessoas. Muitos vibraram a cada manobra de Ítalo Ferreira, no surfe, da fadinha Rayssa Leal, no skate, ou no ‘Baile de Rebeca’ na ginástica artística. Foi a melhor campanha do Brasil nas Olimpíadas: sete ouros, seis pratas e oito bronzes. Os nomes ainda estão frescos nas memórias. Mas, onde estão os heróis olímpicos de edições passadas, como Rafaela Silva, Robson Conceição, Sarah Menezes? Até quando lembraremos dos atuais? Infelizmente, a tendência é que eles caiam no esquecimento com o passar dos anos e esse ciclo se repita com outras gerações de medalhistas olímpicos.

Durante as Olimpíadas, os torcedores fazem questão de demonstrar o orgulho pelos vencedores e, influenciados pelo conteúdo midiático, transformam-nos em heróis. Depois, alguns vivem por muito tempo com esse status, mas a maioria acaba caindo no esquecimento. Esquiva Falcão, boxeador que recebeu medalha de prata nas Olimpíadas de Londres em 2012 só voltou a ser falado, principalmente nas redes sociais, quando divulgou seu trabalho provisório: entregador de mini pizzas. Foi o jeito que ele arrumou para ter renda durante a pandemia, pois lutou só duas vezes em 2020 e o dinheiro não foi suficiente. Fora isso, não vemos notícias sobre suas lutas ou como está vivendo, e se ainda vende ou não a comida.

Ilustração: Bianca Esquivel

Por que isso acontece? Primeiramente, pelo pouco conteúdo sobre esportes olímpicos na mídia, que tem preferência pelo futebol, pois é o desporte mais famoso do país e traz um grande retorno financeiro. Há pouco incentivo para essas modalidades, e os atletas não recebem tanta atenção da população nem do governo, que se interessa pela visibilidade e por votos.

Além disso, consideramos ‘heróis’ apenas os vencedores, desvalorizando aqueles que apesar de também se esforçarem muito, não conseguiram medalhas. No livro ‘Atletas olímpicos brasileiros’, de Katia Rubio, há um pensamento interessante do professor e pesquisador Jorge Olímpio Bento quando ele afirma que “as pessoas não passam de meros objetos de consumo e descarte. Somente têm alguma serventia e valia, enquanto conservam as aptidões e condições para se enquadrarem nos figurinos decretados pelas bitolas da moda”. É exatamente isso que acontece com os atletas olímpicos, que são lembrados apenas quando as Olimpíadas estão em alta, sendo descartados e deixados nas sombras logo depois.

Também influi nesse apagamento, a má distribuição de verbas entre as diferentes partes produtivas do desporte, uma vez que os maiores investimentos estão voltados ao alto rendimento e apenas uma fatia é destinada à base. Entre 2016 e 2021, o governo federal investiu mais de R$ 750 milhões por ano em atletas olímpicos e paralímpicos, através do tripé formado pela Lei das Loterias, Bolsa Atleta e Lei de Incentivo ao Esporte.

Para as crianças e adolescentes que querem entrar para a vida esportiva, não basta o governo “construir mais quadras, piscinas, parques ou coisas do gênero. É formar professores capacitados para darem aulas, diz Erich Beting, jornalista brasileiro especializado em negócios do esporte.

Os problemas estão interligados. Primeiramente, há pouco incentivo e investimento na base, logo, terão menos atletas qualificados para disputarem as Olimpíadas. Com isso, a tendência é que não haja uma renovação abrangente no quadro de atletas e tampouco uma forte competitividade nos campeonatos nacionais. Com pouca competitividade e quase nada nas mídias noticiando sobre esses eventos, não há público e sem ele o retorno financeiro é pequeno, tornando cada vez mais difícil arranjar patrocinadores que queiram investir nessas modalidades. E, sem aporte financeiro, os profissionais acabam tendo que treinar com materiais e condições inadequadas para um atleta que quer ser olímpico.

De certa forma, dois pilares da sociedade dividem a responsabilidade por esse abandono dos heróis olímpicos. O primeiro são os governos – federal, estaduais e municipais – por não criarem políticas públicas que estimulem a prática dos esportes olímpicos entre os jovens, pois é na base onde poderiam achar novos talentos. Nossos governantes também investem muito dinheiro no alto rendimento e pouco na base, e têm mais interesse político do que um verdadeiro sentimento de progresso nos esportes. E o segundo responsável é a mídia, por dar pouca visibilidade às modalidades, preferindo o futebol, que dá muito mais audiência e retorno financeiro. Mas os veículos de comunicação de massa também são responsáveis por influenciar na criação do rótulo de ‘heróis’ olímpicos durante os Jogos e depois deixar os atletas esquecidos.