Ana Carolina Gonçalves
Em agosto de 2021, Milton Ribeiro, ex- ministro da Educação, disse que crianças com deficiência atrapalham os outros alunos. Em junho de 2022, o mesmo Milton foi exonerado e preso por um escândalo de corrupção que envolvia desvio de verbas destinadas à educação. Mas este texto não é sobre ele. Como cidadã, futura jornalista, e irmã do Breno, 16 anos, que tem Síndrome de Down, eu tenho a obrigação de discutir sobre os desafios impostos à inclusão de crianças com deficiência no sistema educacional brasileiro.

Em seu site oficial, o Ministério da Saúde classifica pessoas com deficiência como “aquelas que têm impedimento de médio ou longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o que, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade”. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, de 2019, realizada pelo Ministério da Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 8,4% da população brasileira com mais de dois anos de idade apresenta alguma deficiência. Isso corresponde a mais de 17 milhões de pessoas.
Acredito que esse número, por si só, justifique a relevância de dialogar sobre a inclusão social de pessoas com deficiência (PcD). Porém, em tempos de retrocesso, me pergunto: se não estamos trabalhando para incluir essas pessoas, o que estamos fazendo? A resposta aponta para uma cultura de exclusão, que relegou às pessoas com deficiência uma condição histórica de marginalização e cerceamento de seus direitos, como o pleno acesso à educação.
Mas por que ainda temos que falar sobre esse tema? Em primeiro lugar, porque o direito à educação é legalmente garantido às pessoas com deficiência. Tanto a Constituição Federal (1988) quanto a Política Nacional de Educação Nacional na Perspectiva Inclusiva de 2008, além de formalizarem a educação inclusiva, responsabilizam o Estado pela igualdade nas condições de acesso, permanência e atendimento especializado à pessoa com deficiência na rede regular de ensino.
Em segundo lugar, porque a escola é um dos espaços que, a partir das relações que se desenvolvem dentro desse ambiente, oferece às crianças uma das primeiras experiências de pertencimento social. Nesse sentido, a presença de crianças com deficiência matriculadas em classes comuns têm um impacto direto sobre todo o ambiente escolar, já que além de potencializar o desenvolvimento de habilidades intelectuais e sociais dos alunos com deficiência, atua na construção de uma sociedade formada por pessoas capazes de conviver com a diversidade, seja esta qual for, de maneira mais empática e respeitosa.
Mas o preconceito de pessoas como o ex-ministro citado no começo é apenas um dos obstáculos impostos à existência de um sistema de ensino inclusivo. Segundo o Anuário Brasileiro de Educação Básica de 2021, por mais que o número de alunos com deficiências matriculados no ensino básico tenha dobrado em um período de dez anos, somente 28,3% das escolas no Brasil apresentam salas multifuncionais para atendimento especializado, e apenas 56% apresentam banheiros adequados para uso de alunos com deficiência ou mobilidade reduzida.
Dessa forma, é preciso salientar que a garantia de acesso sem que haja estrutura física e profissional para receber esses alunos não é o suficiente para que a inclusão de fato aconteça. Defender a educação inclusiva no Brasil é reconhecer a luta histórica de pessoas com deficiência, reconhecer os avanços conquistados até agora e lutar para que os direitos garantidos na legislação sejam assegurados e colocados em prática.